O Almacén de Tangos Generales: discos, livros e coisinhas de tango que funcionava em um cantinho da Plaza Dorrego |
Uma vez eu vi essa cidade eufórica, com cascatas de listras celeste-e-branco até no altar da catedral -- e o tom escuro dos uniformes militares pesava por toda parte. Foi em julho de 1978. Eles ainda não tinham cansado de celebrar a Copa, ganha no Monumental de Nuñez, um mês antes. Não era uma Argentina bonita...
Agora também tem muitas bandeiras. De todas as cores. Há desespero e desencanto, mas as pessoas parecem mais vivas. Jornalistas são seres estranhos. Nossa zona de conforto costuma ser a trepidação... Chego quase a desgostar da quietude da Plaza Dorrego, vazia e silenciosa. Mas é aqui que eu venho respirar, após mais uma dezena de entrevistas que contam sempre a mesma história. "Fomos traídos", repetem os portenhos perplexos, vendo o país à deriva e suas economias virando pó, no curralito bancário.
Parei para um jerez no Café Dorrego. Com seus quase ou mais de 100 anos -- dependendo do interlocutor --, o bar de paredes descascadas, mesas de pernas meio bambas e balcão de madeira à moda antiga é o meu cantinho mais querido. Procurava alguma "normalidade" na cidade virada do avesso. Vou encontrá-la do outro lado da praça, na lojinha simpática: "Almacén de Tangos Generales", anuncia a placa.
Quem me recebe é Julio Alvarez Vieyra, 74 anos, produtor musical, empresário do mundo do tango, fundador da célebre casa noturna El Viejo Almacén. Encontrar Don Julio foi como abrir as janelas de Buenos Aires: ali, na lojinha apertada, a atmosfera é suave, livre da tensão respirada em cada esquina. Ele conta histórias, mostra músicas, sugere roteiros... "É um desperdício estar aqui só a trabalho, você tem que ir ouvir boa música".
Don Julio conviveu com todas as grandes figuras do tango por mais de meio século e me adotou de vez, quando cantei a letra inteira de "Mano a Mano". "Onde você aprendeu?". Explico que cresci ouvindo tangos em casa, paixão de meu pai, e ele conclui: "Seu pai lhe educou muito bem". A essa altura, já somos quase amigos de infância e ele até se oferece para me guiar, em busca de boa música ao vivo, na noite de Buenos Aires -- plano que não concretizamos, por conta das minhas muitas entrevistas...
A tarde passou voando. Sete meses depois, voltei a Buenos Aires, para cobrir o Fórum Social da Argentina. A agenda corrida não me deixou voltar para uma visita ao Almacén de Tangos Generales. Voltei à cidade algumas vezes, vi a loja fechada e, depois, ocupada por um novo comércio. O garoto que vendia camisetas não soube me informar o que acontecera com o Almacén ou com Don Julio.
Em 2008, zapeando a internet, vi a resenha de um disco de uma tangueira canadense, Linda Lee Thomas, dedicado à memória de Julio Alvarez Vieyra, "morto recentemente, de câncer".
Não pude me despedir dele, mas não vou esquecer aquela tarde em Plaza Dorrego.
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