26 fevereiro 2013

Ilha de Páscoa: passeio de barco às ilhas sagradas dos Rapa Nui

Meu barquinho se aproximando do Motu Kao Kao, na Ilha de Páscoa
O intrépido barquinho San Miguel aproxima-se do Motu Kao Kao

O mar em torno da Ilha de Páscoa é um show à parte. Por mais difícil que seja dar as costas à beleza da ilha para contemplar o Pacífico — até os moais, com exceção dos espetaculares Los Siete, estão sempre voltados para a terra — o espetáculo daquelas águas furiosas merece atenção.

Não satisfeita em ver, resolvi desafiar aquelas ondas coléricas em um passeio de barco às ilhas sagradas dos Rapa Nui, os habitantes originais da Ilha de Páscoa.

O mar bravo da Ilha de Páscoa
A fúria das ondas na Ilha de Páscoa é um espetáculo à parte

Acho que eu nem precisava de muita desculpa para me convencer a alugar um barquinho com motor de popa e me lançar naquelas ondas.

Só a importância histórica e cultural das ilhas já valeria o passeio. É nos motus (ilhotas) Nui, Iti e Kao Kao que o manutara faz seus ninhos. Essa espécie de andorinha é considerada sagrada pelo povo Rapa Nui.

Penhasco onde estão o Vulcão Rano Kao e a Vila Cerimonial de Oronfo, na Ilha de Páscoa
No alto desse penhasco ficam o Vulcão Rano Kao e a vila cerimonial de Orongo


Todos os anos, o primeiro guerreiro a coletar um ovo de manutara garantia para sua tribo o governo da Ilha de Páscoa, no Ritual do Homem Pássaro celebrado na vila cerimonial de Orongo.

Tem que ter estômago forte para resistir ao batidão das ondas, mas esse passeio de barco às ilhas sagradas dos Rapa Nui foi a coisa mais emocionante que eu fiz na Ilha de Páscoa.

Veja como foi:

Caleta Hanga Piko, Ilha de Páscoa, ponto de partida para o passeio de barco às ilhas sagradas dos Rapa Nui
A Caleta (marina) Hanga Piko tem vestígios de três antigos ahu (plataformas de moai), um deles ainda exibe um imponente moai

Caleta Hanga Piko, Ilha de Páscoa, ponto de partida para o passeio de barco às ilhas sagradas dos Rapa Nui


Ilha de Páscoa:
Passeio às ilhas sagradas dos Rapa Nui

Este passeio de barco é para quem gosta de aventura e não tem propensão a enjoos. O barquinho com motor de popa que leva os turistas até os motu tem pouco mais de dois metros e quase some no meio das ondas.

O mar em torno da Ilha de Páscoa não tem nada de camarada: ruge e se atira sobre a costa como uma fera em pleno bote. Só de ver um ondão crescendo como um edifício na minha frente, o coração chegava a encolher.

Caleta Hanga Piko, Ilha de Páscoa, ponto de partida do passeio de barco às ilhas sagradas dos Rapa Nui
Tem coisa mais simpática do que um atracadouro com vasinhos de plantas? Repare no ahu ao fundo. À direita, o San Miguel pronto pra zarpar — só esperando eu vestir o obrigatório colete salva vidas

Mas valeu a pena controlar o meu medo, porque o espetáculo é belíssimo. A subida e descida das ondas dá a sensação de que estamos testemunhando os primeiros dias da criação, como se aquele pedacinho de terra à deriva no oceano imenso tivesse acabado de emergir das águas, no meio de uma explosão vulcânica.

Foi o pessoal do Tupa Hotel quem me deu a dica sobre Carlos Teao, mergulhador rapa nui que conhece muito bem os humores do mar em torno da ilha e que leva turistas até os motu.

Barco partindo para o passeio às ilhas sagradas dos Rapa Nui
Basta passar do quebra mar que o balanço começa

Carlos pilota um barquinho chamado San Miguel, com pouco mais de dois metros de comprimento (com a heresia de converter a medida oficial, pés, para o sistema métrico...) de pura petulância azul e branca.

O dia marcado para o meu passeio de barco às ilhas sagradas dos Rapa Nui (e que deveria ter sido o meu último na ilha) amanheceu simplesmente horroroso. Não era só a chuva: eram trovões, relâmpagos e um vento inclemente.

Barco se aproximando do Motu Nui, na Ilha de Páscoa
Olha o ondão crescendo pra cima da gente, enquanto o barco se aproximava do Motu Nui (a sequência da foto ficou toda tremida, adivinhe por quê...)

Paulina, funcionária do Tupa Hotel, me olhou preocupada quando cheguei à recepção perguntando se Carlos já tinha chegado pra me apanhar. "Tem certeza que vai sair de barco com esse tempo?"

Logo depois, porém, como é comum em Rapa Nui, a chuva parou e o sol apareceu. Só faltou avisar ao mar, que insistia em continuar se comportando como se estivesse no meio de uma tempestade, apesar do dia radiante.

Navegação aos motu da Ilha de Páscoa
A proa do San Miguel ultrapassa mais uma onda. Nessa montanha russa, a descida é que é punk
Passeio de barco às ilhas sagradas dos Rapa Nui, na Ilha de Páscoa
Tenho que confessar que dava um medinho dessas pedras inóspitas 😨
Aproximação de barco do Motu Iti, Ilha de Páscoa
Este é o Motu Iti

Logo que o San Miguel contornou o quebra-mar da Caleta Hanga Piko, eu percebi que a aventura não seria nada parecida com um passeio de pedalinho.

Foi só a gente deixar para trás a ponta de terra que nos servia de abrigo e o bicho pegou pra valer: ondas de quase quatro metros de altura faziam o barco parecer um carrinho de montanha russa.

Motu Iti, ilhota sagrada na Ilha de Páscoa
Depois de muito tempo, as aves marinhas estão voltando a fazer seus ninhos nos motu. Olha as fragatas no céu (e desculpem a contraluz)

Que o digam as centenas de fotos irremediavelmente tremidas que foram parar na memória da minha câmera. O jeito era me segurar direito no banquinho, confiar na perícia de Carlos e curtir a beleza de Rapa Nui vista do mar.

As ilhas sagradas dos Rapa Nui

Motu Nui, Motu Iti e Motu Kao Kao são três ilhazinhas minúsculas que afloram diante de um penhasco sobre o qual se assenta o Vulcão Ranu Kao, um dos três grandes da Ilha de Páscoa.

O acesso aos três motu é muito difícil, por conta da fúria do mar e da ausência de praias (as ilhotas são rochas nuas saltando de dentro d'água). Menos para quem chega voando, como as aves marinhas, que converteram Nui, Iti e Kao Kao em seu local de desova e criação de filhotes.

Aves marinhas nos motu da Ilha de Páscoa
Uma política de preservação ambiental está trazendo as aves marinhas de volta aos motu sagrados

Depois de um período de caça inclemente às aves marinhas na Ilha de Páscoa — processo que colocou em risco a sobrevivência de várias espécies — uma nova política de preservação ambiental está devolvendo aos motus sagrados dos Rapa Nui sua condição de berçário da fauna emplumada local.

Quando a gente se aproxima das ilhotas, dá para ver milhares de aves marinhas fazendo seus ninhos ou alimentando seus filhotes. Elas fazem uma senhora algazarra sobre aqueles paredões de pedra.

Penhasco sobre o mar na Ilha de Páscoa
Os penhascos da Ilha de Páscoa também são lindos vistos do mar
Penhasco sobre o mar na Ilha de Páscoa

Atualmente, para garantir a tranquilidade das aves, é proibido desembarcar nos motus — com aquelas ondas, esse desembarque também seria extremamente arriscado. 

Fiquei imaginando o tamanho da coragem dos guerreiros rapa nui que participavam do Ritual do Homem-Pássaro e chegavam lá nadando, coletavam o ovo do manutara, voltavam a nado e ainda escalavam os 300 metros de altura do penhasco que leva à vila de Orongo, ao lado do Vulcão Rano Kao.

Passeio de barco às ilhas sagradas dos Rapa Nui, na Ilha de Páscoa


O Ritual do Homem-Pássaro
O Ritual do Homem-Pássaro era importantíssimo na tradição do povo Rapa Nui. Era uma espécie de “triatlo místico e político”, por meio do qual o povo original da Ilha de Páscoa escolhia seus comandantes.

Todos os anos, no mês de setembro, as tribos da Ilha de Páscoa se reuniam em Orongo. Cada uma delas indicava seu hopu (o guerreiro mais hábil, um campeão), a quem cabia disputar o ritual.

Ao amanhecer, os guerreiros desciam os 300 metros do penhasco de Orongo até o mar, nadavam até os motu, recolhiam um ovo de manutara e voltavam à vila cerimonial.

Penhasco sobre o mar na Ilha de Páscoa


O primeiro a chegar garantia o título de Tangata Manu (campeão do Ritual do Homem-Pássaro) e o chefe de sua tribo ganhava a posição de comandante militar de todos os Rapa Nui durante um ano.

O Ritual do Homem Pássaro foi realizado na Ilha de Páscoa até a segunda metade do Século 19.

Saiba mais sobre o Ritual do Homem-Pássaro e a Vila de Orongo


Como contratar o passeio de barco às ilhas sagradas dos Rapa Nui
Fiz contato com Carlos Teao através da equipe do Tupa Hotel, onde fiquei hospedada.

O aluguel do barquinho San Miguel normalmente custa US$ 80 para o passeio aos motu, com direito também a uma parada na caverna de Ana Kai Tangata.

Carlos Teao, mergulhador Rapa Nui que oferece passeios de barco aos motu da Ilha de Páscoa
Carlos pilotando o San Miguel

Carlos normalmente leva até quatro passageiros. Como eu estava sozinha, Carlos me deu um desconto e cobrou US$ 70. Para contratá-lo, o telefone é 977110961.

É importante avisar que esse passeio de barco às ilhas sagradas dos Rapa Nui é bem radical. A embarcação é pequena, chacoalha que é uma loucura e não tem muito onde a gente se segurar.

Não é passeio para fazer com crianças e mesmo adultos devem pensar bem se querem arriscar o batidão. Férias são pra ser divertidas, não uma fonte de estresse. Se você tem medo do mar, escolha outra atividade na Ilha de Páscoa.

Caleta Hanga Piko, Ilha de Páscoa


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2 comentários:

  1. Olá! Estou planejando minha visita à ilha, e queria ter uma ideia melhor da duração desse passeio... Dá pra encaixar outras atividades no mesmo dia ou ele ocupa o dia todo?

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  2. Oi, Amanda, fiz esse passeio em uma manhã. Dá pra programar outras atividades no mesmo dia.
    Aproveite a Ilha de Páscoa. O lugar é um sonho

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