4 de março de 2003

Comer em Santiago de Cuba: a lagosta clandestina


Santiago de Cuba
No sentido horário, meus passeios por Santiago de Cuba: o Quartel de Moncada, a Praça da Revolução, uma rua do Centro Histórico da cidade e a descida do Castelo do Morro para a prainha de Los Aguaderos

Música deste post: Amo esta Isla, Pablo Milanes

Hoje é meu ultimo dia em Santiago de Cuba. E é meu terceiro dia no país, o que significa 72 horas bebendo Tukola, um refrigerante tão delicioso que faria você trocar a sua mãe por uma Pepsi — e diet.

Mas meus passeios por Santiago de Cuba já reforçaram em mim um certo estoicismo revolucionário.  Fui ver alguns símbolos da Revolução Cubana, como o  Quartel de Moncada e o Museu da Clandestinidade, e também a Casa Antonio Maceo, combatente pela independência de Cuba.

Agora, é hora do mojito à beira-mar, prólogo para uma baita lagosta, totalmente clandestina e simplesmente deliciosa. 

Veja como foi essa aventura gastronômica:

A lagosta clandestina de Santiago de Cuba



Santiago de Cuba
Joel e Negro, meus amigos em Santiago de Cuba

O mojito da hora é um aperitivo para a lagosta que vou comer daqui a pouco, no "restaurante de Negro".

A casa — "ainda em construção e já parece ruína", como diz Caetano Veloso — fica na vila pesqueira de Los Aguaderos, aos pés do morro do Castelo. Negro vive à beira-mar desde que nasceu. 

Conta que é preciso permissão governamental para pescar lagostas,  mas há muitos clandestinos. Os peixes e mariscos não podem ser vendidos diretamente ao consumidor, mas sim às tiendas e às empresas de beneficiamento oficiais. 

Negro não pode ter lagostas em casa, poderia dar encrenca com a polícia. Assim, ele cozinha clandestinamente para turistas.

Negro foi militante e gosta de Fidel. “Cuba não é perfeita, mas está melhor com o comandante". Como Felipe, motorista do coquito, diz que tem confiança e torce por Lula no Brasil. “Vai precisar de apoio de todos vocês”.

Lagosta em Santiago de Cuba
Clandestina e obesa 😁. A foto já não estava grande coisa na cópia em papel. Escaneada, ficou assim...

O povo cubano parece bem nutrido, mas eu não sei o que eles fazem com as lagostas: são todas obesas, pra dizer o mínimo. 

Uma unicazinha já se esparrama por todo o prato. Negro serviu a minha lagosta com o purê de uma raiz que eu vou ficar devendo o nome. Tem gosto de batata, mas a cor é acinzentada.

Como a lagosta “está um pouco proibida” — segundo um inesperado dialeto tucanês que eu não sei onde Negro aprendeu —, desta vez a refeição não pode ser na varandinha simpática, de cara para a praia de Los Aguaderos. 

O banquete é servido no “salão” com ar condicionado: o quarto de Negro, onde ele arruma uma mesa caprichada, ao lado da cama. Eu não sou totalmente estranha à clandestinidade, mas de clandestinidade gastronômica eu nunca tinha ouvido falar. 

Praia de Los Aguaderos, Santiago de Cuba
 A comunidade de Los Aguaderos tem moradias precárias à beira-mar

Este almoço é a despedida dos meus amigos santiagueros Joel e Negro. Eles me enchem de recomendações, como se eu tivesse sete anos de idade: “Cuidado em Havana, lá, são todos safados”. E desandam a falar cobras e lagartos. Eu sempre achei que rivalidade era coisa de cariocas x paulistas...

Vou sentir falta deles. Da companhia, das histórias que contam e, especialmente, da esperança inarredável que demonstram, não só em Cuba, mas no mundo inteiro. Hora de ir e Negro me abraça: “Fale da gente, no Brasil. Conte que a gente acredita em vocês”. Na porta do meu hotel, também me despedi de Joel com um abraço. “No te olvides de volver, periodista”. Um dia eu volto, compañero.

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