30 de setembro de 2016

Lello e Bertrand livrarias de Portugal que valem como museus


Livraria Lello & Irmão no Porto em Portugal
A Livraria Lello & Irmãos, no Porto, tem cara de catedral


Eu sou doida por livrarias. Em viagens, sempre me pego esquadrinhando prateleiras, tateando encadernações, sentindo o cheiro do papel... Até em países onde o alfabeto me é estranho, como a Grécia, ou onde a língua parece herdada de outra galáxia, como a Hungria.

Imaginem, então, que farra que eu não faço nas livrarias da terrinha 😀. E me esbaldo na Lello e na Bertrand, livrarias de Portugal que valem como museus.

Além do prazer evidente de poder decifrar as palavras contidas nos meus objetos de desejo, visitar livrarias de Portugal é constatar que nossos companheiros de idioma levam essa instituição muito a sério.

Livraria Lello & Irmão no Porto em Portugal
Livraria Lello & Irmão no Porto em Portugal
O grande vitral do teto da Livraria Lello e a fachada ainda envolta em tapumes


Não é à toa que Portugal tem dois verdadeiros monumentos aos livros: a Livraria Bertrand, em Lisboa, é "apenas" a casa livreira mais antiga em atividade no mundo.

Livraria Lello & Irmão, ícone da Cidade de Porto, emplaca todas as listas de livrarias mais bonitas do planeta.

Lelo e Bertrand são duas livrarias de Portugal que viraram atrações turísticas. Mas acervo delas é tão legal que seria um desperdício visitá-las só para clicar umas fotos. Explore essas duas maravilhas e aposto que você ainda vai sair de lá com uma sacolinha de compras 😊.

Veja as dicas:

Duas livrarias de Portugal imperdíveis


Livraria Bertrand em Lisboa, Portugal

A Livraria Bertrand de Lisboa é a mais antiga do mundo ainda em funcionamento


⭐ Livraria Bertrand
Rua Garret 73-75, Chiado, Lisboa

A Livraria Bertrand teve origem em 1732, em pleno Século das Luzes, quando o iluminismo francês começava a atravessar as fronteiras e espalhar-se pela Europa.

O boom das editoras e livrarias em Portugal também foi uma voga soprada desde a França, que “exportou” um grande número de livreiros para a terrinha na primeira metade do Século 18.

Pra a gente ter uma ideia, a Livraria Bertrand já estava em ação — e movimentando círculos literários, editando novos autores e acolhendo acalorados debates sobre arte e política em sua sede — quando aconteceu o terremoto de 1755, hecatombe que define um “antes e depois” em quase tudo na história de Lisboa.

Conta a própria Livraria Bertrand, em seu site, que ela surgiu na Rua Direita do Loreto, pertinho do Largo do Chiado, e era propriedade do francês Pedro Faure. Os Bertrand que hoje dão nome à casa vieram uma década depois da fundação.

O célebre terremoto arrasou a livraria, dizimou seu acervo, mas não acabou com o negócio, que encontrou nova sede em uma área mais distante do Centro da cidade e só retornaria ao Chiado em 1773.

Estátua de Fernando Pessoa na calçada do Café A Brasileira, no bairro do Chiado, Lisboa
Fernando Pessoa na calçada do Café A Brasileira: se vale tomar uma bica no mesmo lugar que o poeta frequentava, também vale fuçar as mesmas prateleiras de livraria que ele, né?


No Século 18, uma livraria era sempre muito mais do que um lugar que vendia livros.

Naquele tempo, livrarias eram centros de debates — as chamadas tertúlias, reuniões de discussão política, filosófica, artística ou o que mais ocorresse, regadas a café, conhaque ou absinto, a depender do gosto dos participantes.

Eram núcleos vivos e intensos que consagravam novos autores ou sepultavam pretensões letradas. Não raro, as livrarias editavam esses autores e mantinham o intercâmbio com casas livreiras de outras cidades e países, contribuindo para inaugurar modas e mentalidades.

O bairro do Chiado era o coração dessa efervescência em Lisboa. A Livraria Bertrand foi uma das grandes estrelas desse universo por onde circularam expoentes como Fernando Pessoa (homenageado com uma estátua a poucos passos da livraria, na calçada do Café A Brasileira), Camilo Castelo Branco e Eça de Queirós.

Bairro do Chiado em Lisboa

O Chiado era o bairro da boemia e das tertúlias em Lisboa


É esse clima que eu vou visitar na Livraria Bertrand, mesmo sabendo que ele não está mais lá.

Hoje, a Livraria Bertrand se parece com muitas livrarias de bom porte e prestígio que se vê por aí. É a cabeça de uma rede de meia centena de lojas espalhadas por Portugal, tem um atendimento profissionalíssimo e um acervo muitíssimo bacana.

Bato o ponto na Livraria Bertrand toda vez que vou a Lisboa. Não chego a ouvir trombetas anunciando seu peso histórico, mas não deixo de imaginar que Fernando Pessoa passou mais de mil vezes por aquela porta, em busca de novidades.

Eu me emociono um pouquinho e faço a feira — engordei um bocado minha biblioteca sobre a História de Portugal e as grandes navegações, na última visita.

Livraria Lello & Irmão no Porto em Portugal

Livraria Lello: "Ó, vós que entrais, abandonai toda a esperança" (de sossego)


⭐Livraria Lello & Irmão
Rua das Carmelitas nº 144, Porto

Pra você ter uma ideia do que esperar da visita à livraria que emplaca todas as listas de as mais bonitas do mundo, saiba que desde 2015 a Lello & Irmão cobra ingresso. E ninguém reclama.

Sério: uma livraria que cobra entradas (se você comprar alguma coisa, os € 3 do ingresso são descontados da fatura). E foi esse o único jeito de controlar um pouco a quantidade de visitantes. Eu acho justíssimo.

Eu e as centenas de turistas que aparecem, diariamente, para admirar sua belíssima decoração interna e brincar de sobe e desce na sua célebre escadaria, que inspirou a uma congênere na Academia de Hogwarts, da série Harry Potter.

Bilheteria da Livraria Lello & Irmão no Porto em Portugal

Bilheteria da Lello — com fila. Foi o jeito que a livraria encontrou para tentar controlar as multidões


Acho justo, primeiro porque a Livraria Lello é uma das grandes atrações turísticas do Porto (e eu disse do Porto, uma cidade onde sobram os encantos). Atrações turísticas costumam cobrar ingresso.

Segundo, porque a aquela muvuca infernal de visitantes deve ser péssima para o negócio original da casa — experimente tentar garimpar um livrinho com uma horda de gente se acotovelando e procurando o melhor ângulo para uma foto...

Livraria Lello & Irmão no Porto em Portugal
Livraria Lello & Irmão no Porto em Portugal
Livraria Lello & Irmão no Porto em Portugal
Livraria Lello & Irmão no Porto em Portugal
Livraria Lello & Irmão no Porto em Portugal

A decoração da Livraria Lello é uma maravilha art nouveau


A Livraria Lello é realmente deslumbrante. Dei azar de encontrar a famosa fachada neogótica ainda envolta nos tapumes de uma cuidadosa reforma — a obra acabou oficialmente no último dia de junho/2016 e eu passei por lá no início do mês — mas o interior da livraria é de deixar a gente boba.

Tem o teto que volteia em nervuras de gesso em torno de um vitral, estantes de madeiras nobres até o teto, bustos de grandes escritores em bronze, edições raras guardadas em armários com portas de cristal. E, sim, tem a escada.

Escadaria da Livraria Lello no Porto em Portugal
Escadaria da Livraria Lello no Porto em Portugal

A escada, ou A Escadaria, pra ser mais exata 😁


A escadaria da Livraria Lello é um prodígio do design. Tem duas “pernas” que se encontram em um balcão, arrodeiam uma pequena balaustrada e lá se vão rumo ao mezanino, em uma curva que mais parece um jogar de ancas.

Uma coisa meio onírico-delirante, ressaltada pela decoração – feérica por baixo, quase soturna por cima.

Estou falando com toda essa propriedade, mas levei quase uma hora decifrando a tal da escada — na verdade, encafifada com o fato de ela não desmoronar com o tanto de gente que empoleirava na vetusta estrutura de carvalho para fazer selfies.

Escadaria da Livraria Lello no Porto em Portugal

A grande pergunta: como é que esta escada... ops, A Escadaria aguenta o peso de tanta gente


A Livraria Lello foi inaugurada em 1906, no alvorecer da Belle Époque portuguesa, um tempo de grande efervescência social econômica e política.

Seu interior meio de catedral foi frequentado por grandes nomes da cultura portuguesa que participavam de debates animados.

Segundo o site da livraria, houve um tempo em que ela funcionava como “sala de leitura”, graças ao sossego reinante por lá — eu queria ter visto esse tempo.

A Livraria Lello é um passeio imperdível no Porto, mesmo que você precise treinar uma respiração zen para enfrentar a muvuca.

Eu treinei e, por incrível que pareça, ainda consegui sair de lá com um livrinho muito bem escolhido.




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4 comentários:

  1. Muito bom.Só um blog antenado, erudito e descolado como o Fragata Surprise para apresentar tão bem essas pepitas.

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  2. oi Cynthia... é verdade que só é permitido tirar fotos do interior da Lello até às 9 horas da manhã? Ana

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    1. Ana, essa regra não está valendo. pelo que apurei, ela foi cancelada a partir da instituição da cobrança de ingressos. Eu cheguei à livraria por volta do meio dia e os cliques estavam a mil por hora :)

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