Barcelona é sinônimo do Modernismo, mas eu me amarro no
Bairro Gótico. Na imagem, a torre da Catedral, do Século 13 |
Barcelona também é o “trópico europeu”, na luz exuberante da Barceloneta e de Port Vell. É o terceiro mundo dos becos do Raval...
Mas a minha Barcelona preferida é outra: ela se revela inteira em um roteiro no Bairro Gótico. É pouco ensolarada, tortuosa e quase monocromática. Tem ruas estreitas, paredes de pedra, balcões nostálgicos e pátios sossegados, em meio à muvuca turística.
O fato é que cartagineses, laietanos, romanos, mouros, visigodos e francos passaram por Barcelona e deixaram um pouquinho de seu sangue, de seu idioma e de seu tempero na alma da cidade. As pegadas mais visíveis dessas trajetórias estão no Bairro Gótico.
Todos esses conquistadores/colonizadores impulsionaram Barcelona, essa bela à beira-mar. Eles foram a correnteza que direcionou a cidade para o comércio e a exploração naval. No Século 12, a vocação se confirmou e a capital catalã se consolidou como potência marítima no Mediterrâneo.
Os artistas de rua são uma presença constante no Bairro
Gótico |
Veja meu roteiro pelo Bairro Gótico de Barcelona e se inspire. É um encontro mágico e cheio de imagens inesquecíveis:
Roteiro no Bairro Gótico de Barcelona
Essas atrações de Barcelona ganharam um post específico, que complementa este daqui. Dá uma olhada: 1.000 anos de história em 10 igrejas de Barcelona
O Bairro Gótico parece girar em torno da Catedral de
Barcelona |
É impressionante a quantidade de vezes que a gente emerge de uma ruela tortuosa qualquer para dar de cara com uma de suas paredes quase milenares.
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O interior da Catedral de Barcelona é de arrepiar de lindo |
A Catedral de Barcelona é dedicada a Santa Eulália, padroeira da cidade, assim como Sant Jordi, ou São Jorge. Eulália foi uma jovem cristã martirizada aos 13 anos de idade, no Fórum de Barcino (a Barcelona do tempo dos Romanos), durante as perseguições religiosas de Diocleciano, no Século 4.
A Catedral de Barcelona que vemos hoje foi construída entre os séculos 13 e 15. Ela é o terceiro templo cristão erguido naquele local.
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Guardo até hoje o ingresso da minha primeira visita à Catedral de Barcelona. O preço do bilhete dobrou, mas o gasto continua a valer muito a pena |
Eu ainda fico impressionada com a quantidade de vezes que
saio de uma rua qualquer do Bairro Gótico e dou de cara com a Catedral |
A Cripta de Santa Eulália, na Catedral de Barcelona |
A catedral é enorme. Seu conjunto ocupa quase 7 mil metros quadrados do coração do Bairro Gótico, entre a Pla de la Seu (“Praça da Sé”), Carrer de Santa Llúcia, Carrer del Bisbe (“Rua do Bispo”), Carrer de la Pietat e a Carrer dels Comtes.
Mas foi só quando entrei na Catedral que as dimensões do edifício me acertaram em cheio — uma vastidão preenchida por milhares de detalhes tingidos num tom de dourado que vem dos candelabros, lampiões e dos vitrais que filtram a luz externa. E também dos douramentos das talhas, claro 😉.
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O interior da Catedral de Barcelona: tudo nela é superlativo |
Reserve pelo menos duas horas para ver a Catedral de Barcelona com calma, pois são muitos detalhes e espaços pra esquadrinhar. Só o corpo principal da igreja deixa a gente tonta de tantos altares laterais, entalhes, vitrais, imagens...
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Atares laterais da Catedral de Barcelona |
Próxima ao altar-mor, abaixo do piso da Catedral, está a cripta de Santa Eulália. Seus restos mortais estão guardados em um ataúde de alabastro.
E não deixe de ver o belíssimo claustro gótico da Catedral, onde 13 cisnes nadam na maior elegância em um espelho d'água. O número é uma alusão à idade de Santa Eulália quando foi martirizada.
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Os cisnes de Santa Eulália tinha acabado de tomar um belo banho na fonte do Claustro da Catedral, quando fiz esta foto |
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Imagem da Virgem de Montserrat |
➡️ Visitas à Catedral de Barcelona
Horários e preços: de segunda sexta, das 8h às 12:45h (igreja e claustro), visita gratuita.
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Reserve pelo menos umas duas horinhas pra ver a Catedral de Barcelona. Ela merece, né? |
Domingos e feriados, a entrada é gratuita na Catedral e no Claustro, das 8:30h às 13:45h. Das 14h às 17, a entrada é paga (7 €).
A Plaça del Rei, diante do Palácio Real de Barcelona (Palau Reial Major) foi projetada no Século 14 para a realização de torneios de cavaleiros — francamente, não consigo pensar em nada mais medieval/sessão da tarde do que isso 😊. (E não confunda a Plaça del Rei com a Plaça Reial, vizinha das Ramblas).
A Plaça del Rei, em frente ao Palácio Real, foi pensada para
sediar torneios de cavaleiros |
O palácio é, na verdade, um conjunto de edificações do Século 14 que reúne o impressionante Salò del Tinell, salão cerimonial da corte catalã, a Torre do Rei Martí, o Palácio de Lloctinent e a Capela de Santa Ágata.
O Palácio de Lloctinent tem um pátio lindíssimo. O edifício abriga o Arquivo Geral da Coroa de Aragão (Arxiu de la Corona d'Aragó).
Pátio do Palácio de Lloctinent |
Dependências do Palácio Real: à esquerda, a Capela de Santa
Ágata e, à direita, o Palácio de Lloctinent e Torre do Rei Martí |
A principal unidade do MUHBA está instalada no conjunto
monumental da Plaça del Rei |
⭐Museu Histórico de Barcelona (MUHBA)
Plaça del Rei, s/n
De terça a sábado, das 10h às 19h. Domingos, das 10h às 20h.
Entrada: € 7, válida para todas as unidades do MUHBA
Bem vindas ao ano 50 a.C. — e a gente chega lá de elevador 😊 |
Plataformas permitem que o visitante caminhe pelas ruas de
Barcino sem impactar os vestígios arqueológicos |
O percurso por Barcino é super didático. O visitante
realmente compreende o que está vendo |
Acima, um tear encontrado nas escavações de Barcino. Abaixo, maquete de uma casa romana |
Quem nos espera ao final da curtíssima descida de elevador é Barcino, a Barcelona Romana. Sobre plataformas com piso de vidro, é possível caminhar sobre as ruas e construções da cidade do Século 1 a.C.
Você vai ver restos da muralha romana de Barcelona, oficinas, residências e muitos objetos recuperados nas escavações. Tudo devidamente explicado e contextualizado. Viagem é isso, o resto é reles deslocamento espacial 😊.
Esculturas da época romana escavadas em Barcelona |
Mas nem tudo no MUHBA é romano. Essas esculturas são
medievais e estão expostas no Salò del Tinell |
O Museu da História de Barcelona não se limita ao Palácio Real. Ele tem 16 espaços museológicos, vários deles no Bairro Gótico, como os restos de um Templo de Augusto, a Via Sepulcral Romana e o Centro de Interpretação de El Call, o bairro judeu (veja no mapinha no final do post).
Pisos em mosaico da velha Barcino |
Vestígios de elementos decorativos encontrados no Sítio Arqueológico de Barcino |
Depois de ver Barcino, volta-se à tona no tempo por um breve instante, só o tempo de subir as escadarias do Palácio Real para percorrer a trajetória de Barcelona ao longo da Idade Média até os nossos dias.
Placa dos primórdios do Cristianismo em Barcelona |
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Ainda hoje guardo o ingresso da minha primeira visita ao Museu Histórico de Barcelona, em 2011 |
Esta passagem sobre as muralhas do Palácio Real de Barcelona
era usada pelos condes e a corte para chegar à Capela de Santa Ágata |
⭐Mais vestígios romanos no Bairro Gótico
Depois de ver Barcino no MUHBA, estique o passeio à Plaça Nova (onde está a entrada principal da Catedral de Barcelona) para ver a reconstrução parcial de um aqueduto e uma torre romana.
Nesta mesma praça, a Casa de l’Ardiaca (Casa do Arquidiácono da Catedral) guarda em seu interior restos da muralha romana. O edifício agora é a sede do Arquivo Histórico de Barcelona e pode ser visitado de segunda a sexta, das 9h às 20:45h, e aos sábados, das 9h às 13h. A entrada é gratuita.
Reconstrução parcial do aqueduto romano na Plaça Nova |
Aproveite para ver os traços da decoração modernista que a Casa de l’Ardiaca ganhou no final do Século 19, quando foi sede do Colégio de Advogados (uma espécie de OAB). A reforma ficou a cargo de Lluis Domenèch i Montaner, o mesmo arquiteto do Hospital de Sant Pau, do Palau de la Música Catalana e da Casa Lleó Morera, no Passeig de Gràcia.
Com o mesmo ingresso que você comprou para ver o MUHBA na Plaça del Rei, visite a Via Sepulcral Romana, na Plaça de la Villa de Madri (a cerca de 300 metros da Plaça Nova) e os vestígios do Templo de Augusto, na Carrer de Paradis nº 10, entre 10h e 19h.
Na Idade Média, El Call tinha os edifícios mais altos de
Barcelona — e, possivelmente, as ruas mais estreitas |
Call é a palavra catalã que designa as áreas onde os judeus estavam autorizados a viver nas cidades, durante a Idade Média. El Call de Barcelona abrigou uma comunidade numerosa e com grande papel econômico na potência marítima e comercial que foi a cidade a partir do Século 13.
Estudiosos apontam que mais de 4 mil pessoas viviam nas ruas estreitas de El Call no Século 14 — o que explica o fato de a área ter os edifícios mais altos da Barcelona medieval.
Nesta casa de El Call funcionou uma das sinagogas do bairro, na Idade Média |
Hoje, esse trecho do Bairro Gótico é um dos mais sossegados e é um prazer perambular por suas ruazinhas muito estreitas. Possivelmente, é a área que melhor preserve a aura medieval em Barcelona.
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A entrada da Casa de la Ciutat já deixa a gente de queixo caído |
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A fachada da sede da prefeitura que dá para a Plaça de Sant Jaume ganhou uma reforma neoclássica |
Plaça Sant Jaume (entrada pela transversal Carrer Ciutat)
Aberta à visitação apenas aos domingos, das 10h às 13:30h. A entrada é gratuita.
Mais uma visita maravilhosa nesse roteiro pelo Bairro Gótico de Barcelona, a Casa de La Ciutat é a sede do Ajuntament (Prefeitura) da cidade.
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No pátio da Casa de la Ciutat estão expostas diversas obras de arte. Esta é a Mulher Sentada, de Manolo Hugué |
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A escultura Mulher, de Joan Miró, lindinha em sua moldura gótica |
A Casa de la Ciutat está instalada em um palácio espetacular, do Século 14, escondido sob a fachada neoclássica que dá para a Plaça Sant Jaume.
Mas na Carrer de Ciutat, uma ria lateral, você vai encontrar a bela fachada gótica do edifício. É nessa rua lateral que está a entrada de visitantes da Casa de la Ciutat, por sinal.
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No Saló del Cent, o Conselho de Barcelona se reúne desde o Século 14 |
O Consell de Cent (“Conselho dos Cem) era um misto de parlamento e tribunal medieval de Barcelona, instituído na primeira metade do Século 13. Tinha poderes para decidir sobre assuntos como tributos e normas sobre o comércio.
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A galeria superior da Casa de la Ciutat, em traços góticos |
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O átrio e o pátio da Casa de la Ciutat |
Durante seus primeiros 100 anos de existência, o Consell de Cent não teve casa própria. Só em 1369, a Casa de la Ciutat começaria a ser construída.
O Conselho funcionou até a derrota catalã na Guerra de Sucessão Espanhola, no começo do Século 18, quando a Dinastia Borbón anulou todas as expressões políticas da autonomia da Catalunha.
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A Casa de la Ciutat é um compêndio de sete séculos da arte decorativa |
No andar térreo da ca, preste atenção no pátio e nas obras de arte expostas. São peças modernistas, como Mulher, de Miró, que fazem um contraponto extremamente agradável ao cenário gótico.
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Palau de la Generalitat, sede do governo da Catalunha desde o Século 14 |
Plaça de Sant Jaume s/n
A sede da Presidência do Governo da Catalunha é um dos raros edifícios oficiais da Europa a manter sua mesma função desde a inauguração. Construído na Idade Média, o Palau de la Generalitat de Catalunya é sede de governo desde sua inauguração, em 1396.
Isso é um grande motivo de orgulho para os catalães, sempre ciosos de sua identidade e autonomia.
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A cada visita a Barcelona, encontrei gente se manifestando em frente à sede do governo. Na foto maior, um protesto contra as prisões dos independentistas catalães |
É praticamente inevitável transitar pelo Bairro Gótico sem dar de cara com o Palau de la Generalitat, que domina a paisagem da Plaça de Sant Jaume — e também com as frequentes manifestações políticas que se organizam diante de suas portas. Coisas da democracia, como o velho palácio.
As feições atuais do palácio são neoclássicas, mas ele ainda guarda pátios e salões que relembram sua origem medieval. Uma de suas grandes atrações é a Capela de Sant Jordi, do Século 15, que pode ser vista em uma visita guiada.
A famosa Pont del Bisbe (a passarela “gótica” construída em 1929 sobre a Carrer del Bisbe) liga o Palau de la Generalitat à Casa dels Canonges.
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O Verger do Palácio Real era um espaço para o lazer ao ar livre da corte dos Condes de Barcelona |
A entrada no museu é gratuita no primeiro domingo de cada mês, nas tardes dos demais domingos (das 15h às 20h), e nos feriados de Santa Eulália (12/02), Corpus Christie La Mercè (24/09), além do Dia Internacional dos Museus (18/05).
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O Museu Frederic Marès tem o pátio mais lindo que eu vi em Barcelona. Abaixo, a torre da Catedral emoldurada pelas laranjeiras |
O Museu Frederic Marès está instalado no antigo Verger (jardim interno) do Palácio Real de Barcelona.
Na verdade, chamar de jardim é pouco: tratava-se de um espaço verde destinado ao lazer da corte, cercado por pavilhões avarandados e pórticos. No centro do pátio, ainda hoje vicejam laranjeiras.
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O café no pátio do museu é um grande lugar para uma pausa na muvuca do Bairro Gótico |
Não é preciso pagar ingresso para ter acesso a esse pátio e, até por isso, ele virou um dos meus refúgios preferidos, um oásis na muvuca do Bairro Gótico, à sombra das torres da Catedral. Entre abril e setembro, um café ao ar livre funciona lá.
Dentro do edifício, o Museu Frederic Marès exibe a coleção reunida pelo artista catalão, com ênfase na escultura — que era sua especialidade.
São peças que datam desde a antiguidade até o Século 19. Parte da obra de Marès também está exposta no museu.
A Espanha na Fragata Surprise
A Europa na Fragata Surprise
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Passei alguns dia na cidade e dei aquela geral, passeando sem rumo. Mas foi no Gótico que me perdi. Andei, andei e fotografei. Foram deliciosos passeios pelas ruelas do Gótico, especialmente após anoitecer - horário em que fica ainda mais especial. Foi paixão! Abraços.
ResponderExcluirBom, eu sou suspeita, né Paula? Eu tenho mania e paixão pelo Século 12. Troco qualquer farra por uma visita a um claustro medieval :)
ExcluirTambém é a minha Barcelona preferida! Amo!
ResponderExcluirA região mais fascinante de uma cidade espetacular. Não é pouco, né?
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