31 de março de 2011

Girona, uma preciosidade catalã

Casario à beira do Rio Onyar, em Girona, Catalunha
À beira do Rio Onyar, o casario substituiu as muralhas medievais de Girona

Música deste post: Milonga del Moro Judío, Jorge Drexler

Atualizado em janeiro de 2020

Uma cidade cheia de vida, abrigo de um patrimônio histórico encantador e povoada por gente que embarca no transporte público cumprimentando afetuosamente o motorista com tapinhas nas costas e distribuindo sorrisos para os desconhecidos.

Esta é Girona ("Gerona", em castelhano), a 90 quilômetros ao norte de Barcelona, no caminho para os Pirineus.

Catedral de Girona, cenário de Game of Thrones
Cenário de Game of Thrones, a Catedral de Girona botou a cidade no radar de muita gente
Com cerca de 100 mil habitantes — que parecem estar em permanente bom humor — Girona é o lugar perfeito para quem quer uma pausa no burburinho de Barcelona sem abrir mão da vibrante alegria catalã.

Mas não se engane: nada aqui lembra a vidinha de aldeia. Cinemas de última geração, concertos e lojas de grifes badaladas convivem com o belíssimo e bem preservado patrimônio medieval de Girona.

Nas ruas de Girona ouve-se pouco castelhano. O cartão de visitas do orgulho catalão vem logo na simpática correção que eles fazem da nossa pronúncia do nome da cidade: "Djiróna", nos fazem repetir, esconjurando para sempre o G aspirado espanhol.

El Call, biarro judeu medieval de Girona
O encanto meio misterioso das ruelas e escadarias de El Call de Girona, o bairro judeu medieval mais preservado da Europa Ocidental
Desde 2016, quando estreou a 6ª temporada de Game of Thrones, as atenções sobre essa cidade cheia de encantos aumentou um bocado, quando sua belíssima Catedral, do Século 11, interpretou o Septo de Baelor, centro religioso de King's Landing, a capital da fictícia Westeros.

Girona, porém, é muito mais do que uma locação de série de TV — por mais eletrizante que seja. É uma cidade repleta de belezas e com um altíssimo astral. Você pode visitá-la em um bate e volta desde Barcelona ou mesmo programar uma temporada mais esticada. Aposto que você vai adorar.

Veja como foi minha vista a Girona:


Palácio da Família Montcada e Torre da Igreja de Sant Feliu, Girona, Catalunha
Ao lado da Catedral, o antigo palácio da Família Montcada tem um anjo na cumeeira. Ao fundo, a torre da Igreja de Sant Feliu (São Félix), do Século 12

Roteiro em  Girona

Visitei Girona em março de 2011, junto com minha irmã Simone, em um roteiro que também incluiu Barcelona e Carcassone, nos Pirineus Franceses.


Chegamos de Carcassonne, que está 200 km ao Norte (cerca de 4 hora de trem) e de Girona retornamos a Barcelona (100 km ao Sul).

O que nos chamou a atenção, desde que pisamos na cidade, é a solicitude dos gironenses. Do taxista aos recepcionistas do hotel, dos transeuntes ao motorista do ônibus que nos levou ao centro, todos tinham um festival de dicas sobre "visitas obrigatórias" na cidade.

Igreja de Sant Feliu, Girona
Ao lado da Catedral, a Igreja de Sant Feliu é apontada como um dos melhores exemplares da arquitetura gótica em Girona

Meu principal interesse em Girona era ver El Call, antigo bairro judeu, considerado o gueto medieval mais preservado de toda Europa Ocidental.

A pequena Girona, porém, tem muito mais história para contar, desde que sua povoação original pelos ausetanos (ibéricos).

Dizem que as muralhas da cidade enfrentaram 25 cercos, até serem parcialmente destruídas na invasão napoleônica, em 1809.

Uma rua típica de El Call (esq) e o  Portal de Sobreportes, que era uma das três portas da muralha medieval de Girona
Uma rua típica de El Call (esq) e o  Portal de Sobreportes, que era uma das três portas da muralha medieval de Girona

A Catedral de Girona
Plaça de la Catedral s/n
🕒 Horários: De abril a outubro, visitas das 10h às 18:30h (em julho e agosto, alto verão, até as 19:30h). De novembro a março, das 10h às 17:30h.
💲 Ingressos: € 7, com audioguia incluído. O bilhete dá direito a visitar também a Basílica de Sant Feliu (que abre das 10h às 17:30 de segunda a sábado, e das 13h às 17:30 aos domingos).

Os romanos, visigodos e mouros deixaram sua marca em Girona, mas é o imperador franco Carlos Magno, que pôs fim ao domínio muçulmano sobre a cidade, no Século 8, que reina como uma espécie de "pai" e padroeiro — já de seu longínquo sucessor, Napoleão, Girona não guarda a menor saudade.

Praça da Catedral de Girona, Catalunha
A Praça da Catedral de Girona vista do alto da escadaria
A lenda do retorno do imperador franco está por toda parte. Na Catedral de Santa Maria — de dar nó na garganta, de tão linda!— um dos destaques é o “trono de Carlos Magno”, atrás do altar principal, à espera do legítimo dono que, diz a lenda, retornará um dia à cidade.

Nós fizemos um tour guiado informal à Catedral de Girona. Como éramos as únicas visitantes, a funcionária que nos vendeu os ingressos nos acompanhou e deu explicações detalhadas sobre toda a igreja — a paixão dela pelo edifício era contagiante.

A Catedral de Santa Maria de Girona nasceu românica, no Século 11, ocupando o espaço e de um templo dedicado ao culto cristão desde o começo da Idade Média.

Claustro românico da Catedral de Girona
O Claustro românico da Catedral de Girona

O estilo românico, porém, só se conserva atualmente no belo Claustro da Catedral. Ela hoje tem uma fachada barroca (do Século 18) e um interior francamente gótico, fruto de várias reformas executadas a partir do Século 12.

Uma coisa que muitos gironenses faziam questão de nos dizer, recomendando a visita à Catedral, é que ela tem “a maior nave gótica do mundo”, com 22,98 metros de largura, 50 metros de comprimento e 34 metros de altura (esses números exatos eu tive que pesquisar no Google 😊).

Os arquitetos e operários levaram 50 anos para conclui essa nave, que é um prodígio técnico para a época de sua construção, o Século 15.

Catedral de Girona, Espanha
O ingresso para a Catedral de Girona e, à direita, a escadaria em uma cena de Game of Thrones


Fachada barroca da Catedral de Girona
A fachada barroca da Catedral de Girona é uma obra do Século 18

Mas a imponência da Catedral de Girona vai muito além de sua nave gótica. Ela fica sobre uma elevação, no miolinho de ruas medievais, e exibe aos visitantes sua portentosa escadaria do Século 16, com 90 degraus — que várias vezes você viu em Game of Thrones — como cartão de visitas.

O interior da Catedral, infelizmente, não pode ser fotografado. Mas preste muita atenção ao Trono de Carlos Magno, ao altar-mor, em prata e esmalte (Século 14) e ao arrebatador Painel da Criação.

O Painel da Criação (El Tapiz de la Creació) é um imenso bordado (3,65 m x 4,70 m) fica no Tesouro da Catedral de Girona. Ele data do Século 11 e serviu originalmente como baldaquino para o altar-mor da igreja. 

A Catedral de Girona fica no ponto mais alto da cidade e é alcançada por uma escadaria com 90 degraus — agora famosa por suas participações em cenas de Game of Thrones

O bordado retrata várias cenas do Genesis e da vida de Cristo. Detalhe: acredita-se que a peça que chegou aos nossos dias seja apenas um fragmento da obra original.

Durante a breve ocupação moura em Girona — entre os anos de 717 e 785 — a catedral foi convertida em mesquita, mas não há traços visíveis desse período.

Igreja de Sant Feliu, Girona, Catalunha, Espanha
O ingresso para a Catedral também dá direito à entrada na Igreja de Sant Feliu

La Força Vella, primeira fortificação de Girona foi obra dos romanos

As muralhas de Girona
Apesar da violência do bombardeio bonapartista, em 1809, Girona ainda preserva cerca de 5 km de muralhas.

Essas fortificações, do Século 14, podem ser percorridas no Passeig Arqueòlogic, programa vivamente recomendado aos turistas pelos gironenses e que permite caminhar pelas velhas muralhas da cidade.

As primeiras fortificações de Girona, porém, são muito mais antigas. Foram obra dos romanos, no Século 1 a.C. 

A chamada Força Vella era um conjunto de muralhas e bastiões que cercava completamente a povoação, então estabelecida no ponto mais alto da cidade — o que hoje é o entorno da Catedral.

Centro Histórico de Girona
Nos arredores da catedral ainda há vários vestígios das fortificações romanas
Parte das construções da Força Vella ainda são visíveis na cidade — saindo da Catedral, siga para a esquerda (para o Sul) pela Carrer de la Força, que acompanha parte do traçado dessas antigas fortificações.

No final da Carrer de la Força você verá uma das entradas para subir às muralhas medievais de Girona, um passeio bem popular entre os turistas, mas que eu não fiz por causa de uma chuvarada que caiu no meu segundo dia na cidade (o dia de retornar a Barcelona). 

Cidade Velha de Girona, Catalunha
O Barri Vell (Centro Histórico) de Girona é cheio de "passagens secretas". Olha euzinha, pronta pra atravessar uma delas para entrar em El Call, o bairro judeu 😉

Quem já fez, porém, recomenda muito, pois a caminhada oferece vistas espetaculares da cidade. Há vários acessos à muralha. Outro deles fica em frente aos Banhos Árabes, do Século 11, na direção Norte de quem sai da Catedral.

Rua do bairro judeu medieval de El Call, Girona, Catalunha
Caminhar por El Call é um passeio encantador em Girona

El Call de Girona
Bem próximo à Catedral (siga pela Carrer de la Força), El Call é o antigo bairro judeu de Girona, um emaranhado de ruelas inacreditavelmente estreitas, escadarias e passagens em arco cheio de encantamento e um certo ar de mistério. 

Bairro judeu medieval de El Call, Girona, Catalunha

Bairro judeu medieval de El Call, Girona, Catalunha
O que tem de escadaria no lugar de rua em El Call...

Até a expulsão dos judeus da Espanha, em 1542, era lá que vivia a comunidade judaica da cidade. É muito gostos passear sem rumo por lá.

Se você quiser conhecer mais sobre a história desse bairro e das pessoas que viveram lá, é uma boa ideia reservar um tempo para visitar o Museu d’Història dels Jueus (Museu Histórico dos Judeus), na Carrer de la Força nº 8.

Bairro judeu medieval de El Call, Girona, Catalunha

 Como estamos na Catalunha, o passeio por El Call só poderia terminar com uma taça de cava e tapas deliciosas — pulpitos (polvinhos minúsculos), croquetas (croquetes) e uma porção de butifarras (linguiças) — devidamente devoradas na mesinha do pequeno Café L'Arc (Carrer de la Força nº 9, El Call).

El Call, bairro judeu medieval de Girona, Catalunha
Um dos belos balcões de El Call e, à direita, o Café de l'Arc, onde fizemos uma gostosa farra bem catalã

Arcadas medievais na Rambla de la Llibertat, Girona, Catalunha
As arcadas medievais da Rambla de la Llibertat

Rambla de la Llibertat
Ao cair da noite, os gironenses desafiavam o frio do começo de março nas mesas dos bares e cafés da Rambla de la Llibertat — hapyy hour de sexta-feira pra lá de animada.

Eles explicam que a Rambla de la Llibertat é sempre muito movimentada. Ela corre em paralelo ao Rio Onyar e foi aberta no final do Século 19, em uma reforma urbana que preservou as arcadas medievais, sob as quais trabalhavam os artesãos de Girona.

Rambla de la Llibertat, Girona, Catalunha
Tudo pronto para a farra de sexta-feira na Rambla de la Llibertat

O nome da rambla (“Da Liberadade”) refere-se á árvore plantada no local, na comemoração dos 60 anos da libertação da cidade da ocupação napoleônica.

Casario à beira do Rio Onyar, em Girona, Catalunha
O famoso casario colorido às margens do Rio Onyar, a imagem mais conhecida de Girona

Orla do Rio Onyar
Diante do Rio Onyar, que corta Girona, uma parte das muralhas medievais bombardeadas por ordem de Napoleão deu lugar a um amontoado de prédios que lembram a simpática desordem de Ponte Vecchio, em Florença — a luz também tem algo de Toscana nessa encantadora cidade catalã.

Casario à beira do Rio Onyar, e a torre da Igreja de Sant Feliu, em Girona, Catalunha
As cores e a luz á beira do Rio Oynar tem um quêzinho toscano



O Rio Onyar, na verdade, divide o tempo em Girona. Na margem direita está a cidade medieval, enquanto a vida contemporânea pulsa na margem esquerda. 

Uma série de pontes comunicam as duas porções da cidade — porque, afinal, o tempo não para em nenhum dos dois lados.

Entre as muitas passarelas do tempo sobre o Rio Onyar, preste atenção à Ponte de Pedra e à Ponte de Ferro (a Pont de les Peixateries) esta uma obra de Gustave Eiffel, o engenheiro da torre parisiense. Ela é exclusiva para pedestres, muito movimentada e fotogênica.

Orla do Rio Onyar à noite, Girona, Catalunha
A Orla do Rio Onyar à noite é bem romântica

Orla do Rio Onyar à noite, Girona, Catalunha

À noite, foi impossível fazer uma foto decente da Pont de les Peixateries. O vai e vem de gente fazia tremer forte estrutura metálica. 

Mas a vista da Ponte de Ferro é maravilhosa: a torre iluminada da Catedral e o contorno das construções antigas que derramam seu reflexo suave sobre o rio.

Pont de les Peixateries, obra de Gustave Eiffel em Girona, Catalunha
Pont de les Peixateries, obra de Gustave Eiffel

Como chegar a Girona
Girona está 100 quilômetros ao norte de Barcelona, de onde é farta a oferta de trens até lá, desde os regionais pinga-pinga até o TGV.

Estação ferroviária de Girona, Catalunha
A estação ferroviária de Girona estava em reformas, quando estivemos na cidade
Os horários e preços podem ser consultados no site da Renfe, a companhia de trens do Estado Espanhol.

Os ônibus da Alsa também ligam Barcelona a Girona, com saídas em diversos horários.


Estação ferroviária de Girona, Catalunha
Nós compramos o bilhete de trem de Girona para Barcelona na estação, mesmo. Mas você pode encontrar preços melhores comprando o bilhete com antecedência no site da Renfe

Passagem de trem para Girona, Espanha
Chegamos a Girona vindas de Carcassonne, com baldeação em Figueres, a cidade natal de Salvador Dalí 

Hospedagem em Girona


Hotel Sol Melià Girona
Carrer de Barcelona n° 112

O Meliá de Girona foi, disparado o melhor hotel de todo o nosso roteiro por Barcelona, Carcassone e Girona.

Hospedagem em Girona: Hotel Meliá Girona
Simone fez a única foto do nosso apartamento no Meliá Girona. Não reparem a bagunça 😁
Pelo antigo site venere.com (que não existe mais), conseguimos uma promoção tipo last-minute, fazendo a reserva na véspera da chagada. A diária no apartamento duplo custou € 60, senhora pechincha.


Bem que a gente estava precisando do conforto, depois das opções mais mochileiras de Barcelona e Carcassonne.

Edifício dos Correios, Girona, Catalunha
O Edifício dos Correios é uma das construções mais significativas da parte nova de Girona. Foi inaugurado em 1922 e sua fachada tem esculturas de Frederic Marés

O Meliá Girona tem quartos grandões, camas confortáveis, travesseiros fofinhos, banheiro enorme e todos os mimos que andavam fazendo falta: máquina de café, TV de LCD com dezenas de canais de notícias (foi assim que ficamos sabendo do terremoto no Japão, em março de 2011) e janelas à prova de ruídos.

O hotel fica ao lado de uma gigantesca loja do El Corte Inglés (que dá 10% de desconto aos hóspedes do hotel) e bem pertinho da estação ferroviária.

Transporte em Girona

Na Carrer de Barcelona, na Cidade Nova, param os ônibus da Linha 2 (1,30 Euro) que levam até o Centro Histórico de Girona (parada Correos). 

A Espanha na Fragata Surprise
Madri
Andaluzia: CádisCórdobaGranadaRonda e Sevilha
Castela e La Mancha: Toledo

Castela e Leão: SegóviaCatalunha: BarcelonaGirona Tarragona
Comunidade Valenciana: Valência
Galícia: Santiago de CompostelaCaminho de Santiago e cidades da rota

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