A Avenida Paulista é uma baita tradução de São Paulo |
Uma coisa que estou adorando em toda essa onda em torno do fim do mundo é que, finalmente, estamos tendo um dezembro com um textinho mais criativo.
Morro de tédio daquela ladainha tipo "onde vai passar o Natal?", "Já tem programa para o Ano Novo?". Sinto uma preguiça imensa diante de decorações com neve e gorrinhos, vitrines com roupinhas brancas caríssimas...
Morro de tédio daquela ladainha tipo "onde vai passar o Natal?", "Já tem programa para o Ano Novo?". Sinto uma preguiça imensa diante de decorações com neve e gorrinhos, vitrines com roupinhas brancas caríssimas...
Charge de André Dahmer |
Se construíssem uma Arca de Noé só para recolher os malucos que têm a receita para escapar do apocalipse, pode apostar que ela zarparia da Avenida Paulista, que concentrava uma inacreditável variedade deles, na tarde do último sábado.
Veja como foi meu passeio por este cenário que é a cara de São Paulo:
No último fim de semana, o vão livre do Masp tinha lotação esgotada de pregadores anunciando a última chamada para aceitar Jesus e de profetas com explicações científicas do fim do mundo (tão detalhadas que empalideceriam um infográfico da Folha).
Até Elvis Presley, desafinado pela emoção e com as costeletas pregadas nas hastes dos óculos escuros, resolveu aparecer para a festa. Tudo muito mais divertido e mais criativo que a decoração de Natal da Avenida Paulista, uma das coisas mais cafonas que vi nos últimos tempos.
Até Elvis Presley, desafinado pela emoção e com as costeletas pregadas nas hastes dos óculos escuros, resolveu aparecer para a festa. Tudo muito mais divertido e mais criativo que a decoração de Natal da Avenida Paulista, uma das coisas mais cafonas que vi nos últimos tempos.
Fim do mundo com MC do além |
E eis que em meio a essa cacofonia bíblico/ufológica, fui abordada por Moisés. Em vez de me oferecer uma gleba na Terra Prometida ou me esmagar com um decálogo pétreo, Moisés me deu um livro — “Morte nas Nuvens”, de Agatha Christie.
Demorei um pouquinho pra entender, mas ele explicou: um grupo de garotos ligados ao blog Sobrelivros conseguiu que livrarias e editoras doassem algumas centenas de exemplares, que estavam sendo distribuídos ao público que passava pelo Masp.
Sem qualquer proselitismo, sem pedir nada em troca (e sem qualquer conexão com o fim do mundo). Apenas entregavam o livro e desejavam feliz natal.
Sem qualquer proselitismo, sem pedir nada em troca (e sem qualquer conexão com o fim do mundo). Apenas entregavam o livro e desejavam feliz natal.
A distribuição gratuita de livros era recebida com simpatia por muita gente — mas a porção Alabama de Sampa estranhou |
Mesmo assim, muita gente recusava o presente, expressando aquele Alabama do Planalto de Piratininga que os reaças tanto querem que São Paulo seja.
Mas eu não fui ao MASP para incrementar meu repertório de profecias nem para me irritar com a porção Alabama de Sampa.
Entre acervo permanente e exposições temporárias, o MASP é sempre uma festa para os olhos |
A visita foi para ver a exposição Luzes do Norte, com gravuras alemãs dos séculos XIV e XV, e o lindo quadro de Vermeer Mulher de Azul Lendo uma Carta, que está de passagem pelo Masp após cuidadosa restauração, programa que eu recomendo enfaticamente.
As gravuras pertencem ao Museu do Louvre e fazem parte da coleção doada pela família do barão Edmond de Rothschild. A estrela da exposição é Albrecht Dürer — considerado um gênio da gravura e o grande responsável pelas luzes do Renascimento terem feito a travessia dos Alpes rumo ao Norte — com Lucas Cranach, o Velho, de principal coadjuvante.
A mostra, porém, é uma grande oportunidade para descobrir outros artistas simplesmente maravilhosos, como o que ficou conhecido como O Mestre do Baralho, por conta de seu trabalho mais célebre, e que comparece com uma Prisão de Cristo de arrepiar.
Leia também: 4 motivos para ir ao MASP - e voltar sempre
A mostra, porém, é uma grande oportunidade para descobrir outros artistas simplesmente maravilhosos, como o que ficou conhecido como O Mestre do Baralho, por conta de seu trabalho mais célebre, e que comparece com uma Prisão de Cristo de arrepiar.
Leia também: 4 motivos para ir ao MASP - e voltar sempre
A Mulher de Azul é o primeiro quadro do holandês Johannes Vermeer (popularizado pelo filme Moça com Brinco de Pérola, história romanceada da concepção de uma de suas obras) a ser exposto na América do Sul.
O quadro pertence ao acervo do Rijksmuseum de Amsterdã, que está em reforma, e faz uma turnê por algumas grandes cidades.
No Masp, A Mulher de Azul ganhou a primeira exposição de uma obra só de que já tive notícia, com quatro salas onde estão expostas, além da tela, ilustrações que explicam o processo minucioso de sua restauração.
Além das exposições temporárias, palmas para a forma escolhida pelo Masp para exibir seu acervo permanente, já há alguns anos, agrupando as obras por temas.
A Anunciação, de El Greco, o quadro que me ensinou a gostar de pintura, já de volta ao cavalete projetado por Lina Bo Bardi, em foto de 2017 |
Não que a gente precise de novidade para visitar o melhor museu do Brasil, mas é estimulante ver como as diversas épocas e escolas trataram determinados assuntos. Muito mais legal que percorrer salas organizadas numa burocrática ordem cronológica.
Atualmente, o acervo está organizado em três mostras. Deuses e Madonas- A Arte do Sagrado exibe obras do Século 14 ao 19, entre elas o quadro que me ensinou a gostar de pintura, uma linda Anunciação, de El Greco, que me deixa com um nó na garganta só de escrever sobre ela.
Romantismo: a arte do entusiasmo propõe uma abordagem instigante do tema, rompendo com os limites dessa escola para encontrar uma inspiração romântica em obras de Salvador Dali, Manabu Mabe e Tomie Ohtake, por exemplo.
Por fim, as esculturas do Masp estão reunidas em A Obsessão da Forma, onde estão as bailarinas de Degas.
MASP- Avenida Paulista, 1578. De terça a domingo, das 10h às 18h. às quintas, até às 20h. Entrada: R$ 15 (gratuito às terças). A exposição Luzes do Norte fica em cartaz até 13 de Janeiro. Mulher de Azul Lendo uma Carta fica em exposição até 10 de fevereiro.
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