02 agosto 2024

Roteiro pela Alfama e Castelo de São Jorge em Lisboa

Bairro da Alfama em Lisboa
Quanto mais a gente esquece o mapa, melhor fica a Alfama

Um passeio que eu curto muito em Lisboa é o roteiro pela Alfama e Castelo de São Jorge. Adoro contemplar a cidade das muralhas da fortaleza, ponto mais alto da capital portuguesa, e depois descer ladeiras e escadarias do bairro sem me preocupar muito com o mapa — pra baixo, todo santo ajuda.

A Alfama, sem dúvida, vive uma contradição: é um dos bairros mais representativos da velha Lisboa — parte considerável de suas construções sobreviveu ao terremoto de 1755 — ao mesmo tempo em que é diariamente invadido pelo que o Século 21 tem mais chato a oferecer, o overtourism e as exigências das redes sociais.

Tuc-tucs na Alfama em Lisboa
fachada típica do bairro da Alfama em Lisboa
Os tuc-tucs são um inferno, mas a Alfama ainda é um lugar onde mora gente

Mas nem as hordas de turistas gravando vídeos, nem o vai e vem barulhento dos tuc-tucs, nem os funcionários de restaurantes mercando seus quitutes nas calçadas pra atrair clientes conseguem estragar a Alfama.

Saindo das ruas principais, a gente sempre encontra as velhas fachadas, as roupas nos varais e o sotaque inconfundível do lugar onde mora gente. 

Bairro da Alfama em Lisboa
Bairro da Alfama em Lisboa
Todos os caminhos da Alfama levam ao Castelo

Este roteiro pela Alfama e Castelo de São Jorge aponta os principais monumentos da área, mas não se limite às atrações com pedigree. Entre uma visita e outra, perca-se, suba, desça e arrisque. O passeio vai ficar muito melhor assim.

Veja as dicas:

bairro da Alfama e Catedral de Lisboa
Bairro da Alfama e Castelo de São Jorge em Lisboa
No Alto, as torres da Sé de Lisboa e a Alfama vistos do Elevador de Santa Justa. Acima, o Castelo de São Jorge e o bairro clicados do Miradouro de São Pedro de Alcântara 

Um pouquinho da história da Alfama

Entre os séculos 8º e 12, quando os muçulmanos reinavam em al-Ushbuna (o nome árabe de Lisboa), a Alfama já estava lá, derramando-se desde as muralhas da Fortaleza da Alcáçova (futuro Castelo de São Jorge) rumo ao Tejo.

Alfama vem do árabe al-hamma ou “fonte de águas quentes”. E, de fato, até depois da Idade Média, o bairro foi conhecido por suas fontes — ainda  estão de pé o Chafariz de El-Rei (Rua do Cais de Santarém nº 23) e o Chafariz de Dentro (Largo do Chafariz de Dentro s/n), ambos do Século 13. Alguns banhos públicos (ou alcaçarias) estiveram ativos até o começo do Século 20.

Bairro da Alfama em Lisboa

O que as fachadas mais adornadas por roupas nos varais do que por azulejos não contam é que a Alfama já foi chique, desde o tempo dos mouros. Os mais pobres viviam na parte baixa do bairro, fora da muralha.

Foi a partir da Idade Média, já sob governo cristão, que os pescadores, marinheiros e lavadeiras começaram a subir as ladeiras e a se instalar na porção mais alta da Alfama.

Bairro da Alfama em Lisboa
Bairro da Alfama em Lisboa
Meu truque pra passear confortavelmente pela Alfama é começar lá no alto, no Castelo. Pra baixo, todo santo ajuda

A fama de bairro pobre e autêntico atraiu boêmios para as casas de fado e tabernas da Alfama, no Século 19. No Século 20, pobreza e precariedades tornaram o bairro um primo do Raval de Barcelona e dos Quartieri Spagnoli de Nápoles. Foi o turismo — esse mesmo que hoje ameaça sufocar a Alfama —quem contribuiu para a revitalização da área.

Roteiro pela Alfama e Castelo de São Jorge


⭐Castelo de São Jorge
Rua de Santa Cruz do Castelo s/n

Castelo de São Jorge em Lisboa
Castelo de São Jorge em Lisboa
O Castelo de São Jorge está profundamente ligado à história de Lisboa. No alto, a fortaleza fotografada do terraço do Elevador de Santa Justa

Aproveite que o Castelo de São Jorge abre às 9h, ao longo de todo o ano, e chegue cedo, pra o dia render. Tenho certeza que você vai adorar começar esse roteiro em Lisboa vendo a cidade do mais espetacular dos seus mirantes (o ponto mais alto de Lisboa é uma de suas torres, que se alça a 100 metros sobre o nível do Tejo), em um sítio que lembra os primórdios de sua povoação.

O Castelo de São Jorge tem muita história pra contar. No Século 2º a. C. já havia uma fortificação romana no local. Antes disso, no Século 4º a.C., é provável que fenícios, gregos e cartagineses tenham andado por lá. A Fortaleza também é um ponto perfeito pra se ver Lisboa (quase) de corpo inteiro.

Castelo de São Jorge em Lisboa
Castelo de São Jorge em Lisboa
Castelo de São Jorge em Lisboa
Das muralhas do Castelo de São Jorge dá pra ver Lisboa quase de corpo inteiro

Não é à toa que todos os povos que dominaram o que hoje conhecemos como Lisboa usaram a área do castelo, geralmente com propósitos defensivos. É o caso dos visigodos e dos mouros. Mas ele só virou Castelo de São Jorge quando D. Afonso Henriques, fundador do Reino de Portugal, tomou a fortaleza dos mouros, em 1147 e a transformou em palácio real, posição que ocupou até o Século 16.

Desde a primeira vez em que estive no Castelo de São Jorge, gosto de ficar hooooras passeando por seus recantos. Mas uma pessoa mais objetiva pode reservar cerca de duas horas para a visita aos espaços museológicos, para caminhar sobre as muralhas e curtir seus pátios muito românticos.

Castelo de São Jorge em Lisboa
Castelo de São Jorge em Lisboa
Acho os pátios do castelo muito românticos

Saiba mais sobre o Castelo de São Jorge:
Mirantes de Lisboa


Como chegar ao Castelo de São Jorge
O único transporte que vai deixar você na porta do Castelo é o táxi, pois só os moradores da área têm autorização para circular de automóvel nas proximidades.

ônibus 737, que sai do Largo da Figueira, deixa você a 100 metros da bilheteria (é ladeira, mas é uma caminhada curtinha). Como é a parada final da linha (parada Castelo), não vai ter muito como errar.

Castelo de São Jorge em Lisboa
Bairro do Castelo de São Jorge em Lisboa
Os automóveis que você verá nas imediações do castelo são de moradores da área. Repare na foto acima uma barreira que impede a circulação de veículos não autorizados
  
Se decidir pelo pacote-completo-turistão, dá pra chegar com o legendário Elétrico (bonde) 28 — que eu aposto que vai estar lotado. Desça no Miradouro de Santa Luzia e suba cerca de 300 metros. Outra possibilidade é descer no Miradouro das Portas do Sol e também caminhar 300 metros (também ladeira acima).

Elevador do Castelo em Lisboa
O Elevador do Castelo (edifício com azulejos) é uma das formas de encurtar as subidas desde a Baixa até a fortaleza
 
Uma possibilidade que ainda não testei, mas parece tentadora, é ir caminhando desde a Baixa, com o auxílio dos elevadores do Castelo (embarque na Rua dos Fanqueiros) e do Parque do Chão do Loureiro (embarque no Largo do Caldas) ou das escadas rolantes da Saúde. Mas essa é uma opção pra quem está com fôlego e joelhos em dia.

Castelo de São Jorge em Lisboa
Castelo de São Jorge em Lisboa
 
Horários: o Castelo de São Jorge pode ser visitado diariamente, das 9 às 21h, de março a outubro. No inverno (novembro a fevereiro) abre das 9h às 18h.

Ingressos: €15. Visitantes entre 13 e 25 anos pagam meia-entrada. Maiores de 65 e pessoas com deficiência pagam €12,50. Entrada da gratuita com o Lisboa Card e para crianças até 12 anos de idade.

Bairro da Alfama em Lisboa
Bairro da Alfama em Lisboa
Bairro da Alfama em Lisboa
Bairro da Alfama em Lisboa
Não tenha pressa no passeio pelas ladeiras e escadarias da Alfama

Miradouro das Portas do Sol e Miradouro de Santa Luzia

A partir de agora, o passeio será na descida. Se você não chegou de bonde ao castelo e já aproveitou para ver o Miradouro das Portas do Sol ou o Miradouro de Santa Luzia, sugiro que eles sejam as suas próximas paradas.

Miradouro das Portas do Sol
Museu de Artes Decorativas em Lisboa
O Miradouro das Portas do Sol tem uma parada de bonde bem na porta. O edifício em frente é o Museu de Artes Decorativas

O Miradouro das Portas do Sol está a apenas 300 metros do castelo. Mas não vá até lá em linha reta. A grande graça da Alfama é esquadrinhar suas ladeiras e escadarias e namorar suas fachadas simples e brejeiras.

Aliás, eu gosto do Miradouro das Portas do Sol porque ele oferece uma vista mais íntima para o bairro da Alfama. Os  telhados, ladeiras, quintais e varais de roupa ficam em primeiro plano e isso desfoca o resto da cidade ao longe, construindo um enquadramento aconchegante.

Miradouro das Portas do Sol em Lisboa
O Miradouro das Portas do Sol tem vista para os bastidores da Alfama

O belo edifício que fica bem em frente ao mirante é o Museu de Artes Decorativas (Largo das Portas do Sol nº 2, aberto de quarta a segunda, das 10h às 17h, ingresso de € 10).

Menos de 100 metros abaixo, fica o Miradouro de Santa Luzia, de onde se tem uma vista mais escancarada de Lisboa e do Tejo. Esse mirante costuma estar bastante movimentado, e não é pra menos: se você estiver procurando uma paisagem como pretexto pra se apaixonar pela cidade, vai encontrá-la aqui.

Igreja de Santa Luzia em Lisboa
Miradouro de Santa Luzia em Lisboa
Miradouro de Santa Luzia em Lisboa
Miradouro de Santa Luzia em Lisboa
Atrás do jardim sossegado e da simpática igrejinha está um dos melhores mirantes de Lisboa

Ao lado do mirante está a Igreja de Santa Luzia, do Século 12 (e reconstruída no Século 18, depois do terremoto de 1755). Preste atenção aos painéis de azulejos que decoram as paredes da igreja, onde estão representadas a conquista de Lisboa pelos cristãos e uma cena da Praça do Comércio.

Museu do Aljube - Resistência e Liberdade
Rua de Augusto Rosa nº 42, Alfama

Museu do Aljube em Lisboa
Eu gostei demais da visita ao Museu do Aljube

Do Miradouro de Santa Luzia, basta descer 600 metros pela Rua Augusto Rosa para chegar ao Museu do Aljube, uma das visitas mais impactantes que fiz nesta passagem mais recente por Lisboa. O museu resgata a memória da resistência à ditadura que submeteu Portugal entre 1926 e 1974.

O edifício do Aljube foi usado como prisão desde o tempo da ocupação moura (séculos 8º ao 12) e no período salazarista foi um célebre centro de torturas por onde passaram opositores do regime de todos os matizes — e muitos não saíram vivos de lá.

O tema é pesado, mas a visita é estimulante. O roteiro expositivo do Museu do Aljube é muito bem organizado e didático e seguramente vai envolver qualquer pessoa que se interesse por História e faça questão de entender o mundo em que a gente vive hoje.

Sé de Lisboa e Rio Tejo
A Sé de Lisboa em obras e o Rio Tejo vistos do Museu do Aljube

Reserve 1 hora para ver os cinco andares do museu com calma. 

Falei com detalhes sobre o Museu do Aljube em um post exclusivo sobre os museus de Lisboa que eu tenho certeza que você vai curtir: 5 museus de Lisboa que merecem muito entrar na sua lista

Horários: as visitas ao Museu do Aljube são feitas de terça a domingo das 10h às 18h. Fecha às segundas-feiras.

Ingressos: € 3. Jovens de 13 a 25 anos pagam meia-entrada e maiores de 65 pagam € 2,60. Crianças até 12 anos entram gratuitamente.

Almoço na Alfama

Arroz de polvo na Alfama em Lisboa
Esse arroz de polvo que almocei na Alfama estava bem gostosinho

Se você começou esse passeio às 9h, lá no Castelo de São Jorge, a esta altura vai estar pensando em almoçar. A Alfama anda excessivamente turística, mas ainda é possível encontrar tascas e restaurantes que preservam a autenticidade por lá.

Se eu fosse você, consultava o site Time Out Lisboa pra escolher um lugar próximo ao Aljube e à Sé para almoçar.

No meu passeio mais recente pelo bairro — em pleno feriado do 25 de Abril — almocei em um restaurante de comida portuguesa mais próximo da Baixa. O lugar se chama O Sopinhas (Rua da Madalena nº 50), Não é o caso de se despencar ladeira abaixo pra ir até lá, mas, se estiver nas proximidades, é bom saber que a casa serve comidinha gostosa a preços honestos.

Sé de Lisboa
Largo da Sé nº 1

Sé de Lisboa
A rosácea da fachada é um dos destaques da Sé de Lisboa

Depois do almoço, é hora de visitar a Sé de Lisboa. Bata olhar a carinha de quase-fortaleza — tão característica do período da Reconquista Cristã da Península Ibérica — pra a gente adivinhar que a certidão de nascimento da Catedral vem lá do Século 12.

A Sé de Lisboa pode até não ser tão bonita quanto a Catedral de Évora ou a famosíssima Sé de Braga (essa, mais antiga do que o próprio Portugal), mas tem muitos encantos.

Sé Catedral de Lisboa
Sé Catedral de Lisboa
O altar-mor e os órgãos da catedral são do período Barroco

Historiadores apontam que ela é a igreja mais antiga ainda de pé na capital portuguesa. Foi construída sobre uma mesquita do tempo do domínio mouro, logo após o rei Afonso Henriques conquistar a cidade para os cristãos.

Ao estilo românico original os séculos foram acrescentando elementos góticos e barrocos e o resultado do conjunto é muito bonito.

Sé Catedral de Lisboa
As feições da Catedral são de quase-fortaleza

Preste atenção na rosácea da fachada, do Século 12, arrematada por um vitral da década de 1930 que buscou reconstituir o original, destruído no terremoto de 1755. 

Também merecem destaque o altar-mor do Século 18, o presépio da Capela de São Ildefonso, as pinturas renascentistas da Capela de Bartolomeu Joanes e o Batistério, onde Santo António de Lisboa teria sido batizado.

Sé Catedral de Lisboa
Sé Catedral de Lisboa
No alto, o Coro e a Rosácea da Catedral. Acima, uma Pietá barroca 

Apontados como o maior tesouro da Catedral de Lisboa, os Painéis de São Vicente de Fora, do Século 15, já não estão expostos na Sé: eles fazem parte do acervo do excelente Museu Nacional de Arte Antiga — uma visita que também não pode faltar em seu roteiro por Lisboa.

Horários: entre novembro e abril, a Catedral pode ser visitada de segunda a sábado, das 10h às 18h. Entre maio e outubro, as visitas são às segundas, terças, quintas e sextas das 9:30h às 19h e às quartas e sábados das 10h às 18h. Fecha aos domingos e dias santos.

Ingressos: € 5. Visitantes com 7 a 12 anos pagam € 3. Crianças até 6 anos entram gratuitamente.

Igreja de Santo António de Lisboa
Largo de Santo António da Sé

Igreja de Santo António de Lisboa
Igreja de Santo António de Lisboa
A Igreja de Santo António e a Catedral são vizinhas de porta. Olha elas quase juntinhas na foto do alto

Se a Sé de Lisboa tem a autoridade das catedrais, o templo mais popular da cidade é o que está logo abaixo na ladeira. A Igreja de Santo António de Lisboa foi construída no Século 15, no local onde nasceu e viveu o santo, e está sempre movimentada com os fiéis do padroeiro da cidade.

Muito afetada pelo terremoto de 1755, a Igreja de Santo António foi reconstruída quase do zero, ao longo de quase 50 anos, graças a uma campanha de donativos empreendida pelas crianças da cidade — “Um tostão para Santo António”.

Igreja de Santo António de Lisboa
Igreja de Santo António de Lisboa
Igreja de Santo António de Lisboa
A Igreja de Santo António precisou ser quase toda reconstruída após o célebre terremoto de 1755

No subsolo na igreja, ainda é possível ver os restos de um aposento medieval bem pequenininho, apontado como parte da casa onde nasceu o futuro santo, em 1195.

Frade do Mosteiro de São Vicente de Fora, António estudou em Coimbra e ingressou na recém fundada Ordem dos Franciscanos, no início do Século 13. Foi um pregador muito popular na Itália, onde passou a maior parte da vida e onde morreu, em 1231. na cidade de Pádua, onde está sepultado.

Festa de Santo António em Lisboa

De manhã cedo, a Igreja de Santo António já estava lotada, no dia 13 de junho

Em Lisboa, é cultuado como o santo de casa que faz milagres. A cidade para pra celebrar o dia de Santo António, todo 13 de junho, uma festa popular adorável, que eu acompanhei na viagem de 2016;

Veja que bacana: Festas juninas em Portugal - um jeito especial de conhecer a terrinha

Horário: diariamente, das 10h às 12:30 e das 14h às 17:30h.

Entrada gratuita.

Mais sobre esta viagem



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