10 de março de 2016

Paixão por mercados: a Ceasinha de Salvador

Camarão seco no Mercado do Rio Vermelho, Ceasinha de Salvador
Camarão seco, tempero indispensável na cozinha baiana

Vocês já sabem que sou fã de mercados e estava devendo essa dica: quando for a Salvador, coloque o Mercado do Rio Vermelho, ou Ceasinha, para os íntimos, no seu roteiro.

Além de ser uma ótima feira, a Ceasinha é um bom lugar para provar pratos muito baianos. Dobradinha, mocotó e mariscos de todo o tipo estrelam o cardápio dos restaurantes instalados no mercado — alguns mais "gentrificados", outros com pegada mais popular.

Venda de ingredientes para preparação de caruru, Ceasinha de Salvador
A Ceasinha tem várias barracas especializadas em ingredientes para o caruru, festa/banquete que é uma das mais autênticas expressões da religiosidade baiana, com elementos cristãos e de matriz africana

Venda de ingredientes para preparação de caruru, Ceasinha de Salvador


Também tem a opção de provar algumas comidinhas “importadas”, mas muito bem “aclimatadas” em Salvador, como o já clássico sanduíche de salsichão do Box do Alemão, na Praça de Alimentação da Ceasinha.

De bônus, você vai ter uma pequena aula – teórica e gustativa — sobre as tradições culinárias da Bahia, um mergulho muito além da moqueca. Experimente explorar os boxes da Ceasinha para ver doces, biscoitos, frutas, frutos do mar, requeijão e temperos mil da Bahia...

A Ceasinha é uma tentação.

Ceasinha de Salvador


Hortifruti na Ceasinha de Salvador
Fala se não dá vontade de encher a sacola e correr pra a cozinha?

Não estranhe o nome. Ceasinha é o jeito informal do baiano chamar a filial da Central de Abastecimento da Bahia (Ceasa) que começou a funcionar na margem do Rio Lucaia, no bairro do Rio Vermelho, nos anos 80.

A feirinha fez sucesso e cresceu, especialmente pela variedade e qualidade dos produtos regionais e pelos restaurantes populares que serviam boa comida a preços módicos.

Frutos do mar na Ceasinha de Salvador: camarões e lagostas
O capítulo dos frutos do mar bate um bolão

Em 2014, o lugar passou por uma grande reforma e reabriu bem mais arrumadinho, com muito mais espaço (são quase 9 mil metros quadrados, agora) e 171 boxes que vendem todo tipo de gostosuras.

A Ceasinha também ganhou uma praça de alimentação que costuma lotar nos fins de semana.


Frutos do mar na Ceasinha de Salvador: ostras e vôngoles


Limpa, organizada e fácil de chegar (de carro ou táxi, porque em Salvador ônibus é para os fortes), a Ceasinha está fora do circuito turístico, mas a apenas 2,5 km do famoso Largo da Dinha, no Rio Vermelho.

Cuscuz de milho da Lanchonete Shalom, na Ceasinha de Salvador
O cuscuz de milho da Lanchonete Shalom é uma grande ideia. Eu gosto do meu só com queijo (no alto, à esquerda). Minha irmã Giselle adora combiná-lo com ovos estrelados

Empório Nipo Brasileiro da Ceasinha de Salvador
Uma grande pedida é levar pra casa o bao (pãozinho chinês) do Empório Nipo Brasileiro. Depois, é só descongelar no vapor


Doces na Ceasinha

Eu gosto de começar minhas incursões na Ceasinha nas bancas de doces e beliscos. Adoro as compotas (doces em calda) de frutas, uma variedade que deixa a gente tonta: de casca de laranja, goiaba, mamão verde, jaca...

Tem geleias de tudo, doce de leite de colher ou "tijolinho", goiabada cascão, cocadas branca, preta, puxa, queijadas, doce de amendoim...

Também tem bolachinha de goma, sequilho de nata, bolacha paciência, bolinhas de jenipapo...

As barracas de doces da Ceasinha reúnem todo um universo de delícias baianas que os forasteiros nem imaginam que existam.


Frutos do mar na Ceasinha

O capítulo frutos do mar é um delírio. Camarões fresquinhos, recém chegados de Valença (pertinho do famoso Morro de São Paulo), lagostas, polvos, lulas, caranguejos, siris.

tempero baiano
Os temperos nesta panela fumegante, na casa da minha irmã, quando ficaram prontinhos pra receber os siris comprados na Ceasinha

Ensopado de siri na Bahia
As três etapas dos siris: à esquerda, lavados e prontos para a panela. À direita, prontinhos e apetitosos. Abaixo: na travessa, prestes a serem devorados

Ensopado de siri na Bahia


Se você está imaginando qual seria a graça dessa parte para um turista que está a quilômetros da cozinha de casa, saiba que algumas peixarias preparam as ostras e servem nas mesas da praça de alimentação e até topam aferventar alguns mariscos de preparo mais simples para servir ao "freguês".

Uma coisa que eu gosto na Ceasinha é que os comerciantes e clientes ainda se tratam por "freguês" e "freguesa", oferecem "quebras" (quantidade a mais do produto comprado, de brinde) e "provas" —deixam o comprador experimentar o produto antes de comprar.

Pimentas na Ceasinha de Salvador: malagueta, biquinho e dedo de moça
A baianíssima pimenta malagueta (esq), a cheirosa e suave biquinho (centro) e a dedo de moça

A alma da Bahia na Ceasinha

Um passeio na Ceasinha também permite desvendar aspectos da religiosidade baiana, coisas tão incorporadas ao nosso dia a dia que nem nos lembramos de contar aos turistas, de tão comuns que nos parecem.

Você vai ver a banca de incenso, usado para defumar as casas em ocasiões especiais, as folhas usadas para preparar os banhos rituais que afastam os maus fluidos e ajudam a atrair amor, prosperidade e boa sorte.

Variedade de pimentas na Ceasinha de Salvador
Festival de pimentas. Além de temperar, são tiro e queda contra o o mau olhado

E vai descobrir que pimenta, além de ser um tempero indissociável da nossa cozinha, é tiro e queda para combater o mau olhado.

Pela quantidade de boxes especializados em ingredientes para caruru você vai perceber a importância dessa festa para os baianos.

Temperos para o caruru
Temperos para o caruru: camarão seco, gengibre, castanha de caju, azeite de dendê...

Oferecido aos santos gêmeos Cosme e Damião, a quem os nossos antepassados africanos reconheceram como representações dos ibejis (divindades gêmeas protetoras das crianças), o caruru é um banquete com uma infinidade de pratos e acompanhamentos, celebrado no mês de setembro.

O caruru de Santa Bárbara (Yansã, no Candomblé) é oferecido no mês de dezembro.

Quiabo para caruru na Ceasinha de Salvador
O quiabo, a grande estrela do caruru (esquerda), e as tangerinas mais cheirosas da cidade

Para saber mais sobre essa celebração, leia este post:

As vendas dos ingredientes para os pratos baianos vão de vento em popa o ano inteiro na Ceasinha. Em Salvador, ainda é muito comum as famílias prepararem "comida de dendê" (caruru, vatapá, feijão fradinho, xinxim de galinha) para os almoços das sextas-feiras, dia sagrado para o Candomblé.

E pra você ver como Salvador é sincrética, a santificação da sexta-feira e o hábito de vestir branco nesses dias são heranças muçulmanas, legados do povo malê, um dos maiores contingentes de africanos escravizados na Bahia.

Agora, se você tiver acesso a uma cozinha, fazer a feira na Ceasinha pode virar uma farra inesquecível.

Na última vez que estive lá, com minhas irmãs, o passeio "só para beliscar" acabou virando um almoço antológico, com siris suculentos de entrada e escaldado de caranguejo como pièce de résistance. Dá só uma olhada na foto abaixo para entender o espírito da coisa 😀


Caranguejo em preparo e pronto para servir
Mais resultados da feira: os caranguejos ainda crus (esq) e já prontinhos para a mesa, hummmm  

Mercado da Ceasinha
Avenida Juracy Magalhães Júnior nº 1624, Rio Vermelho. Fones: (71) 3272 6777 e (71) 3018 5733

Horários: de segunda a sábado, os boxes atendem das 7h às 20h. No domingo, das 7h às 14h.
A praça de alimentação funciona das 7h às 21h de segunda a sábado e no domingo, das 7h às 16h.

O estacionamento custa R$ 1,50.

Boxe do Alemão, Ceasinha de Salvador
Praça de alimentação da Ceasinha e o famoso sanduíche de salsichão do Boxe do Alemão - peça o seu com chucrute, você não vai se arrepender

Curte feiras e mercados? Dá uma olhada no monte de lugares legais mundo afora já comentados na Fragata: 
Feiras e Mercados - Índice

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2 comentários:

  1. Oi Cyntia!

    Vim aqui sentir "virtualmente" o cheiro do camarão seco e terminei com os olhos cheios de lágrimas. Que saudade disso tudo!

    Beijos,

    Patricia

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    Respostas
    1. Foi a pimenta, Patrícia :) Mas, sério, a gente até finge que se acostuma a viver longe da alma da Bahia, mas a saudade é permanente. Bjo, querida

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