4 de dezembro de 2012

Salvador: o melhor acarajé da Bahia

Acarajés sendo preparados no tacho da baiana
O tacho de acarajé de Chica. Minha baiana foi pra o Orum, mas a família preserva a tradição com um capricho admirável 

Meu conselho de baiana da gema pra vocês: acarajé só se come em Salvador e no Recôncavo Baiano.
Com um pouco de sorte, dá pra esticar os limites geográficos desse prazer até a Região Cacaueira — eu mesma já encontrei um acarajé delicioso em Itacaré — aonde os saberes africanos da minha terra também alcançam.

E comer acarajé em Salvador é uma arte. Todo mundo tem a sua baiana preferida. Se você não é da terra, é bom pedir indicações aos amigos locais. Uma boa baiana se veste a caráter, começa os trabalhos de tacho e  tabuleiro no final da tarde e respeita as tradições do Candomblé.

Veja minhas dicas para escolher e se deleitar com um bom acarajé em Salvador:

Acarajé em Salvador 


O significado do acarajé
Preparar e vender acarajé faz parte das obrigações de santo das filhas de Iansã (também chamada de Oiá), deusa das tempestades e das batalhas, símbolo da força das mulheres. 

O acará é a oferenda que se deve fazer a Iansã. O acara-jé é o acará que se come —, em iorubá, significa comer.

(Ultimamente, têm aparecido pessoas de religiões cristãs que rejeitam as tradições de matriz africana e vendem um tal "bolinho de Jesus". Isso é uma violência religiosa que não deve ser incentivada).

O traje das baianas de acarajé
No quesito vestuário das baianas, nem sempre você vai encontrar uma baiana de acarajé vestindo os trajes cerimoniais, com belos bordados em ponto Richelieu. Essas roupas, em geral, são reservadas para as celebrações religiosas. 

No dia a dia, as baianas de acarajé costumam usar o axó (a saia longa e solta) e o camisu (a bata) e o ojá (torço que cobre os cabelos). Também é frequente o uso do pano da costa, uma espécie de xale que pode ser amarrado sobre o busto ou cobrir os ombros.

Acarajé de Chica, meu favorito em Salvador
O tabuleiro de Chica, em foto de 2007. Abaixo, a tradição ainda viva em 2019

Acarajé de Chica, Salvador


Todo mundo tem sua baiana de acarajé. A minha é Chica
Quem vê o amontoado de edifícios e o transito caótico da Pituba nem imagina que esse bairro da Orla Atlântica de Salvador já teve cara de vila de veraneio.

Aquele loteamento distante, onde as ruas tinham os nomes das unidades da Federação (como o Território do Guaporé, que hoje só existe como a rua onde eu cresci), era o lugar perfeito para ser criança, nos anos 60 e 70.

Hoje, não resta mais nada das dunas branquinhas da Pituba — uma delas bem coladinha ao muro de trás da minha casa — dos coqueirais e das lagoas, onde hordas de pirralhos construíam fortes apaches, cabanas e navios piratas de pneus velhos e tábuas afanadas das casas em construção. A especulação imobiliária levou tudo.

Felizmente, uma das melhores tradições do bairro ainda resiste: basta uma mordida no Acarajé de Chica e eu volto no tempo.

Mais de 40 anos depois de Chica ter acomodado seu tabuleiro na Praça Brasil, à sombra da estátua da deusa Flora, seu acarajé continua perfeito: casquinha crocante e miolo fofinho.

E o abará também bate um bolão. Com tantas mudanças na Pituba e em Salvador (a maioria delas, para muito pior) é uma bênção encontrar num bolinho de feijão fradinho a essência de uma Bahia que hoje só existe na memória.

Tecnicamente, o tabuleiro de Chica ainda fica na Praça Brasil, apesar de a praça ter sido demolida, no final dos anos 70, para desafogar o tráfego na Manoel Dias da Silva. A barraquinha da baiana teve que subir a calçada.

Todo mundo sabe onde fica o Acarajé de Chica, mas se quiser o endereço, ei-lo aqui: Avenida Manoel Dias da Silva, entre a Rua Paraíba e a Rua Piauí (no estacionamento da Loja Insinuante)

Chica se aposentou em 2011 e mudou-se para a Aracaju. Fiquei imensamente triste quando recebi a notícia de seu falecimento, em 2014.

Seus filhos e filhas, noras genros e netos, liderados por Gregório e a esposa, mantêm a impecável qualidade do acarajé e do abará de Chica. Passo por lá em todas as minhas visitas a Salvador (a última, em julho de 2019) e cada mordida no acarajé é um flash da minha infância.

Vida longa ao acarajé de Chica e à memória da baiana que me viu crescer e faz parte da minha história.

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Recôncavo Baiano



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